Uma sugestão de virtualização para o ensino da Física nos cursos de ensino profissional de nível secundário


Como trabalho final de Ambientes Virtuais de Aprendizagem, foi-nos sugerido que criássemos um espaço em ambiente Moodle que simulasse uma ação de formação, um curso ou uma disciplina. A este trabalho acresce um plano da formação completa, um guia pedagógico, que é partilhado nesta publicação.

Refleti antes de propor um tema para a formação. Comecei por pensar criar um tema sugestivo, dado ao debate e à discussão em grupo, promovendo naturalmente a pedagogia conectivista, base do ensino a distância, e cujos conteúdos e objetivos eu pudesse desenhar de acordo com os meus interesses...mas depois, enquanto professora de Física e Química (FQ), fui por outro caminho...porque não tentar imaginar a hibridização do ensino num cenário que fosse possível aplicar na prática?

Optei então por criar um plano de hibridização dos módulos de Física do ensino profissional de nível secundário. Não foi inocente a escolha do ensino profissional, já que, de acordo com o próprio programa, "não se pretende um nível de especialização muito aprofundada", o que dá ao professor uma maior liberdade metodológica que noutros sistemas de ensino.

O plano de hibridização que proponho pretende ser exequível, tendo sido selecionadas atividades habituais no ensino online, que apelam a pedagogias construtivistas e conectivistas, ainda que familiares à maioria dos professores e alunos, evitando a disrupção, que é inimiga da inovação sustentada.

O plano assenta nos seguintes pressupostos:

  1. É mantido o horário presencial de cada turma, com acompanhamento constante de professores;
  2. À exceção de algumas aulas específicas - que incluam atividades laboratoriais / experimentais / práticas essenciais ao curso ou cuja complexidade justifica uma introdução teórica do professor - o trabalho proposto aos alunos deve ter uma base semanal e deve ser realizados, ainda que na escola e sob supervisão dos professores, de modo assíncrono, em ambiente virtual;
  3. Para cada disciplina, deve ser feito uma planificação que inclua as atividades a desenvolver e o design de avaliação a adotar. Esta planificação deve ser do conhecimento do aluno antes do início das atividades.
É a referida planificação, no âmbito dos módulos de Física da disciplina de FQ que foi construída neste trabalho.

Dificuldades sentidas na planificação da disciplina:
  1. À cabeça, com um nível de dificuldade muito elevado - a extensão dos programas. Avaliando o programa do ponto de vista de quem quer pegar nele e fazer algo diferente, é verdadeiramente absurda a quantidade de conteúdos previstos para o número de horas disponíveis. As práticas pedagógicas construtivistas exigem tempo para a experimentação do aluno, a avaliação para as aprendizagens exigem tempo para analisar o erro, para a implementação de um feedback de qualidade. Os programas disciplinares atuais - onde incluo as Aprendizagens Essenciais das disciplinas dos cursos regulares - apelam à implementação de metodologias ativas sem contudo terem sido desenhados com a preocupação de tornarem tais metodologias possíveis em termos de tempo disponível.
  2. No seguimento do ponto anterior, a incoerência entre o que está escrito no programa da disciplina, concretamente na Visão Geral do Programa que afirma que "não se pretende um nível de especialização muito aprofundado" e o número de objetivos específicos elencados em cada módulo. Páginas de objetivos num número evidentemente excessivo para uma situação em que "não se pretende um nível de especialização muito aprofundada". Ilustrando o afirmado, só o primeiro módulo tem mais de cinco páginas de objetivos - quase 70 objetivos -  para explorar em 21 horas...
  3. O facto de Física ser uma disciplina conceptual com um formalismo matemático muito próprio e abstrato, que exige, para determinados resultados, uma abordagem de resolução de exercícios mais "lápis e papel".
Dificuldades que prevejo na implementação de um plano como o proposto:
  1. A adaptação necessária não só dos professores como dos alunos, de quem se espera uma atitude de autonomia de autorregulação das próprias aprendizagens;
  2. A falta de recursos das escolas, uma vez que a implementação de um ensino híbrido como o proposto exigiria recursos tecnológicos que atualmente não existem na maioria delas;
  3. A falta de formação dos professores para a planificação das atividades e para a implementação de um design avaliativo concordante com a metodologia proposta;
  4. A falta de hábito de trabalho colaborativo entre professores, essencial para a construção de um plano anual de trabalho que articule de forma eficaz os currículos das várias disciplinas.
Vantagens que observo no plano proposto:
  1. O quebrar o espartilho disciplinar. Os alunos passam a trabalhar nas várias tarefas no momento que considerarem mais adequado, de forma flexível e autónoma, evitando a divisão do horário em blocos sucessivos de diferentes disciplinas;
  2. A valorização de aprendizagens invisíveis dos alunos, por considerar para a avaliação competências digitais que os alunos mobilizam na realização de trabalhos;
  3. A aposta num sistema de ensino em que o aluno tem um papel mais ativo na sua aprendizagem;
  4. A possibilidade de maior motivação por parte dos alunos, dada a diversificação de atividades, o recurso à gamificação, um maior apelo ao trabalho colaborativo.
  5. Depois de feita a planificação das atividades, de forma anual, aos professores competiria não "dar aula", no sentido tradicional, mas supervisionar os trabalhos, ficando com mais tempo para a realização de feedback de qualidade às tarefas desenvolvidas.
E finalmente, considero o plano proposto um bom plano de hibridação?

Fundamentalmente, considero um plano exequível. Julgo que algumas das tarefas possam ter poucas horas previstas - fruto da quantidade excessiva de conteúdos do programa - mas tal constrangimento pode ser colmatado se as disciplinas se associarem entre si e os mesmos produtos forem usados para avaliar competências transdisciplinares (como exemplos, o trabalho em torno de um texto pode ser comum a uma disciplina da área científica e à disciplina de Português; a interpretação de um vídeo em inglês pode incluir a disciplina de Língua Inglesa e outra disciplina no âmbito da qual o vídeo é analisado; qualquer produto digital pode incorporar competências de TIC…).

Avaliando o plano proposto, considero que se aproxima do Modelo Flex, descrito por Moreira&Horta (2020, p.17) como aquele que, acontecendo no território físico da escola, "carateriza-se, sobretudo, pelo desenvolvimento de atividades online, sendo estas a espinha dorsal de todo o processo educativo".

Como conclusão, a incorporação das tecnologias digitais em sala de aula é um processo irreversível. Não faz sentido vivermos imersos numa sociedade digital e em rede, ao mesmo tempo que insistimos  que as novas tecnologias não devem ter lugar em contexto pedagógico. O mundo mudou; o ensino tem necessariamente de acompanhar essa mudança. O foco dos professores de hoje deve ser na formação e, especialmente, na experimentação no sentido de trazer as novas tecnologias para a prática pedagógica, aproveitando para ampliar os recursos educativos e enriquecer os ambientes de aprendizagem, promovendo assim uma simbiose pacífica entre o presencial e o online. 






 


Sem comentários:

Enviar um comentário